Persona (*)

Descrevendo o caminho que estou percorrendo neste estudo sobre a Persona, o Personagem e Papel, começo descrevendo um pouco sobre o processo da Persona. Naffat, nos traz a idéia de Persona como máscara, que recobria a face dos atores, para que eles pudessem delatar os problemas cotidianos. Dario Fo faz um trabalho muito interessante em seu livro Manual Mínimo do Ator, contando a história dos Giannes, (nada parecido com meu nome, uma achado ancestral nestas minhas buscas por conhecimentos históricos, será a percepção télica de Moreno funcionando?). Eles usavam as máscaras que se adaptavam ao rosto do ator, para que ele pudesse dar ao papel, todo o colorido da comédia, que usava e abusava das expressões de confronto de poder, onde os miseráveis que vinham faminto para a cidade de Gênova e Veneza, eram teatralizados, em seu jeito de comer, pela fome que tinham.

_ “hum, se não me contenho como até este braço que me passa aqui do meu lado, de tanta fome que eu tenho” imitando gestos de um “morto de fome” que quer comer quem passa por ali.

A Persona brinca de esconde-esconde, num movimento fenomenológico, através da relação essência versus impermanência, proclamada, por Parmênides e Heráclito. Para Moreno, o ser em constante mutação, através de uma relação constante com um universo aberto, colorido de múltiplas possibilidades.

A Persona tem um valor simbólico muito antigo, muito ancestral, e nos traz, pelas roupagens que se revestiu, a grande marca do ser humano: suas contradições.  Ela nos deu o direito do saber do Si Mesmo. Deu-nos a capacidade de sentir a amplitude da consciência, (e nossos múltiplos papéis, em diversas roupagens) expressos através da sensação de pertencimento. Levou-nos conhecer diferentes maneiras de pensar pelo processo de reflexão e criou com isto as grandes contradições humanas. Trouxe para a vivência do ser humano, múltiplas formas de lidar com uma situação presente. Formas que ora se integram e ora se dicotomizam: passado versus presente versus futuro; o nós versus o eu; de dentro versus de fora; o meu versus o seu; o mundo versus o eu; e tantas outras contradições a que o desafio de ser humano nos faz defrontar. Fazendo através da história uma longa trajetória de evolução (mais de 10.000 anos), porém ainda jovem, pelo desenvolvimento do planeta (mais de 100 milhões de anos de evolução do ser humano checar) 

O Personagem se cobre de uma roupa que a Persona cria para o momento tentando uma intersecção, (na Comédia Del´Art isto se chama de lazzi[1] ou laços) um link com o momento presente. Ele se utiliza do envolvimento com o mundo e com o outro para reinventar em si um movimento de consonância ou discordância. E em cada uma destas roupagens cunha um movimento sutil, que traz da Persona parte do mundo interno, e do que é percebido do mundo externo tentando uma vinculação para se adequar em cada momento. Ou tentando a conexão que lhe favorece o encobrimento.

Por isto durante alguns trabalhos, fazendo emergir personagens surgem dentro do si mesmo a sensação de poder estar em contato com uma entidade profunda que chamei neste trabalho de Persona, que tem sua raiz na espontaneidade que se multiplica em várias, mas conserva sempre sua força de unidade. A Persona ganha espaço na vida cotidiana através do reconhecimento de alguns símbolos, como é esta igreja antiga do sonho, ou um símbolo sagrado, como o cálice do Santo Graal, a chave de um tesouro muito escondido, ou estar nu diante de si mesmo, pois a todo o momento está se conectando com ela, sem ter consciência disto. Embora ela esteja sempre presente no role-playng dos papéis que é jogado, ela só é percebida através das sensações do corpo e dos símbolos universais que ela se conecta. Então, enquanto se está tendo alguma vivência, a emoção que carrega aquele momento traz este lazzi, que delata a experiência da Persona se manifestando no aqui/agora.

Nestes casos, a Persona traz a sensação do mundo individual se conectando ao mundo exterior. Cada roupagem desenvolve uma expressão da ligação dela com o mundo, na atualidade. E isto com o Psicodrama pode ser percebido através dos iniciadores corporais. O corpo delata a ligação com a Persona, traz a emoção à tona quando tocamos no íntimo da pessoa. A emoção aparece, fazendo cair às máscaras que o Personagem tinha colocado, para proteger esta intimidade. É através do riso nervoso, da contração do rosto, das mãos que não param, demonstrando aflição, dos pés que balançam, das pernas que saltitam paradas no lugar, dos olhos e da nuca que pesam, dos tics nervosos, das lágrimas, do choro convulsivo, das sensações de êxtase de estar conectado uma força universal, que sabemos que estamos diante do homem nu, sem máscaras, que já se despiu de todas as roupagens pra se apresentar em sua mais escondida intimidade, levando sempre a uma integração catártica: A Persona revelada.


[1] Fo , Dario ” Manual Minimo do Ator” editora Senac 

(*) Este texto  poderá ser utilizado de forma integral em outros veículos desde que se mantenham a autoria e a forma de contato www.alemdooceano.wordpress.com

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